Muito próximo e familiar para que se possa crer nele – O filho de Maria é um homem como os outros, todavia, pela sua sabedoria e os seus milagres, é totalmente diferente. A sua pessoa esconde um mistério, mas os seus conterrâneos não prestam atenção aos sinais que são dados a eles e não se preocupam de descobrir o seu significado, mas se escandalizam e se fecham à luz.
Naquele tempo, 1Jesus foi a Nazaré, sua terra, e seus discípulos o acompanharam.2Quando chegou o sábado, começou a ensinar na sinagoga. Muitos que o escutavam ficavam admirados e diziam: “De onde recebeu ele tudo isto? Como conseguiu tanta sabedoria? E esses grandes milagres que são realizados por suas mãos? 3Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?” E ficaram escandalizados por causa dele.4Jesus lhes dizia: “Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares”. 5E ali não pôde fazer milagre algum. Apenas curou alguns doentes, impondo-lhes as mãos. 6E admirou-se com a falta de fé deles. Jesus percorria os povoados das redondezas, ensinando.
Este homem não é o carpinteiro
Quem retorna á pátria depois de ter vivido muito tempo no exterior, vive sentimentos contraditórios e tem muitas surpresas. A recordação dos lugares e das pessoas ficou inalterada do momento que partiu, mas durante este tempo a vida continuou avante, muitas coisas mudaram, e ele mesmo não é mais aquele de antes. Busca recomeçar onde parou, de reatar os relacionamentos, mas as suas próprias palavras não possuem mais o mesmo significado.
Mesmo se não podemos interpretar o retorno de Jesus à sua região de origem somente à luz da psicologia comum, porém ela nos ajuda a compreender o conflito que acontece em Nazaré. A sua ausência de casa foi breve, mas neste intervalo de tempo cresceu enormemente a sua atividade para revelar o Pai e a salvação. Mas os seus concidadãos não podem compreendê-lo. Na mentalidade conservadora deles, continuam a vê-lo com o rótulo que lhe atribuíram para sempre, um jovem que ajuda o pai no seu trabalho.
Quem vive um crescimento espiritual, vive também, inevitavelmente, um corte, uma separação do seu ambiente: é uma dinâmica sadia e natural.
Um profeta só não é estimado em sua pátria
Somente através de uma relação repetida e prolongada no tempo se chega ao conhecimento das coisas, dos homens e da natureza. Mas se neste ponto estamos convictos de saber tudo, e que nada mais pode nos surpreender, somos somente vítimas da ilusão. A realidade está cheia de mistérios e ela será sempre objeto de contínuas descobertas até o fim do mundo. Isso vale para os minerais, para as plantas, para os animais e, sobretudo para o homem. O seu coração tem uma tal profundidade que os olhos não podem ver até onde chega. Mesmo assim cada dia nós cometemos também o erro dos concidadãos de Nazaré em relação com Jesus, quando cremos de conhecer as pessoas com as quais tratamos no cotidiano. Não nos interessam mais, consideramos banal aquilo que dizem, não as levamos a serio. E assim impedimos a possibilidade de conhecê-las de verdade.
Se uma pessoa que cremos de conhecer deixa de nos interessar, não é nossa culpa, é culpa de quem vive próximo a ela. Precisa de muita atenção, é uma situação que se cria freqüentemente nas famílias, no trabalho, com os amigos.
De onde recebeu ele tudo isto?
Quem sabe quantas vezes dissemos uma frase semelhante, quando algum dos nossos conhecidos improvisamente se tornou famoso, no bem ou normal. Quem teria imaginado que aquele tipo ali que vimos deste pequeno fosse um pintor de talento, ou um escritor genial. Mas o mesmo pintor ou poeta, se alguém lhe perguntasse como tinha feito, responderá de não sabê-lo, de ter somente seguido uma inspiração.
Inspiração é uma palavra metafórica, e dá a idéia de algo que interfere de fora para mudar a vida. Com esta imagem a Bíblia descreve a criação do homem: o corpo foi feito do pó da terra, mas Deus lhe inspira a alma (Gn 2,7). Diante de uma obra de arte é comum dizer que uma Musa, uma deusa da beleza inspirou o artista.
Nós cristãos acreditamos que a vida se desenvolve em continuidade com a criação. Portanto Deus continua a inspirar, envia pensamentos e idéias para realizar o bem e dá a força para cumpri-lo Quando se pergunta aos santos como fizeram tantas coisas, a resposta é única em todos: por graça de Deus sou aquilo que sou (1Cor 15,10).
Tomáš Špidlík
Oração
Senhor, nosso Deus, o teu Filho não foi reconhecido como profeta pelos seus concidadãos, e se admirava da falta de fé deles. Tornai-nos atentos às pessoas que encontramos cada dia, porque hoje o Cristo poderia querer nos falar através de algum delas, ele que vive e reina convosco por todos os séculos dos séculos. Amém!